Por ser especial, norma internacional que evita bitributação entre
países deve prevalecer sobre lei interna que regula o Imposto de Renda.
Assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça ao determinar que a
Companhia Petroquímica do Sul (Copesul) não é obrigada a reter na fonte o
Imposto de Renda sobre pagamentos de serviços prestados por empresas
estrangeiras no Brasil.O caso abordou, de forma inédita na corte, o conceito de lucro de
empresa estrangeira. Para a 2ª Turma do STJ, ao determinar que esses
rendimentos fossem tributados no país da sede das empresas estrangeiras
prestadoras dos serviços, os tratados de bitributação entre Brasil e
Alemanha e Brasil e Canadá — Decretos 76.988/1976 e 92.318/1986 — não se
referiram apenas ao lucro real apurado no fim do exercício pelas
empresas, mas também a recebimentos que interfiram no resultado,
chamados de “lucros operacionais” pelos ministros. O lucro operacional
está previsto nos artigos 6, 11 e 12 do Decreto-lei 1.598/77 como
“resultado das atividades principais ou acessórias, vinculadas ao objeto
social da pessoa jurídica”.O Recurso Especial, interposto pela Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional, foi relatado pelo ministro Castro Meira, acompanhado por
unanimidade pela Turma. O entendimento se baseou no artigo 98 do Código
Tributário Nacional, que dispõe que “os tratados e as convenções
internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e
serão observados pela que lhes sobrevenha”.Segundo os artigos VII e XXI das Convenções contra a Bitributação
acordados entre Brasil-Alemanha e Brasil-Canadá, rendimentos não
expressamente mencionados na Convenção serão tributáveis no Estado onde
se originam. Foi de onde a Receita Federal tirou a interpretação de que
os recebimentos por serviços prestados no Brasil pelas empresas
estrangeiras à Copesul teriam de ser tributados aqui, já que, a rigor,
não são o lucro mencionado nas convenções. Para a União, esses
rendimentos deveriam ser tributados de acordo com o artigo 7º da Lei
9.779/1999 e 685, inciso II, alínea “a”, do Decreto 3.000/1999.Além disso, para o fisco, tratados contra dupla tributação assinados
pelo Brasil não se baseiam no critério do domicílio da pessoa que obtém
renda, mas no critério da fonte, o que atribui o poder de tributar ao
Estado em que tenham sido produzidos os rendimentos, ou no território em
que tenha ocorrido sua disponibilidade econômica ou jurídica.Na primeira instância, o pedido da empresa para que a tributação
fosse afastada foi negado. Ela foi condenada ao pagamento de honorários
advocatícios à base de 10% sobre o valor da causa, fixado em R$ 30 mil.A empresa recorreu e a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, por maioria de votos, deu provimento a apelação: “Os rendimentos
de um residente de um Estado contratante provenientes do outro Estado
contratante e não tratados nos artigos precedentes da Convenção serão
tributáveis nesse outro Estado”, decidiu a corte.No STJ, o ministro Castro Meira concordou com o TRF, entendendo que,
“se considerado o lucro das empresas estrangeiras, o valor remetido pela
Copesul somente será tributável pelo Imposto de Renda no Estado em que
domiciliadas aquelas, neste ponto produzindo efeito o convencionado
entre os dois Estados para fins de evitar a dupla tributação”.Segundo um dos advogados da Copesul, Leonardo Andrade, sócio do Velloza & Girotto Advogados Associados,
o STJ considerou o valor bruto remetido ao exterior como lucro: “O
motivo é que esse valor, por corresponder a uma receita operacional,
comporá os resultados das empresas no exterior e somente lá é que o
imposto poderá ser cobrado”. Segundo o tributarista, a interpretação da
Receita Federal tornaria sem efetividade as convenções contra
bitributação.Clique aqui para ler o acórdão.
REsp 1.161.467
Lívia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.