O adicional de 10% do FGTS esgotou a sua finalidade e deverá ser extinto pelo e. STF

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Por Alexandre Röehrs Portinho[1]

Em cada despedida de
empregado sem justa causa o empregador está obrigado a recolher a contribuição
social à alíquota de 10% (dez por cento) sobre o montante de todos os depósitos
devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a
vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às
contas vinculadas.

Esta contribuição social
surgiu no ano de 2001, depois de proferidas as decisões do Pleno do C. STF nos
autos do RE n.º 248.188/SC o do RE n.° 226.855/RS, quando a União Federal
(Fazenda Nacional) foi compelida a repor as perdas do saldo das contas de FGTS.
Por meio da LC n.° 110, de 2001, a Ré reconheceu o dever de o FGTS computar os
diferenciais de correção monetária referentes ao Plano Verão e ao Plano Collor
I, de, respectivamente, 16,64% (1.º
de dezembro de 1988 a fevereiro de 1989) e 44,80% (abril de 1990), aos saldos
das contas vinculadas do FGTS até então existentes.

Os
objetivos da criação da contribuição são evidenciados nas justificativas do
Projeto de Lei Complementar n.º 195/2001 quando da sua criação, teve por
finalidade criadora vinculada cobrir os déficits resultantes dos expurgos
inflacionários, ou seja, está vinculada àquela situação específica de quando
foi instituída.

Nos exercícios que se seguiram com o
pagamento vinculado da referida exação em âmbito nacional, o valor dos recursos
disponíveis do FGTS, contabilizados no patrimônio líquido, aumentaram
significativamente, tanto que em fevereiro de 2013 a Caixa Econômica Federal –
CEF emitiu o Ofício n.º 0038/2012/SUFUG/GEPAS, informando que a contribuição
adicional poderia ter sido extinta em julho de 2012. Tal posicionamento foi
reafirmado e fica evidenciado em Nota Técnica emitida pela Caixa Econômica
Federal – CEF, posicionando-se favoravelmente à extinção da contribuição em
julho de 2012, pois, não era mais necessário o pagamento da contribuição de 10%
(dez por cento) sobre a multa rescisória, a preocupação do Conselho Curador do
FGTS com relação ao desvio de finalidade da exação fica evidenciada em suas
Atas de Reuniões, exemplificativamente, literis:

“(…) O Conselheiro Flávio José, da CNI, interferiu para
manifestar sua preocupação acerca de uma comunicação enviada pelo Governo, em
fevereiro de 2012, ao Congresso Nacional por meio de um Relatório de Avaliação
de Receita e Despesa, de que estava deixando de repassar 2,96 bilhões de reais
ao FGTS. Tal recurso estava contido nos 10% suplementares, criados no ano de
2001, para ajudar o FGTS a cumprir uma determinação do Supremo Tribunal
Federal, que mandou ressarcir aos trabalhadores o complemento referente ao
Plano Collor I e Plano Verão. Lembrou que em 2001 fora elaborada pelo Congresso
Nacional a Lei Complementar nº 110/2001, aumentando em
10%
o valor da multa do FGTS, passando de 40% para 50%, e aumentando em 0,5% a
contribuição do empregador. Esse aumento de 0,5%, que passou de 8% para 8,5%,
tinha prazo de duração de 60 meses, sendo a contribuição do empregador para
ajudar o FGTS a equilibrar as contas, em decorrência da decisão do STF. Porém,
os 10% sobre o valor da indenização, para demissão sem justa causa, não teve
prazo estipulado, convencionando-se à época que durariam até que a conta se
equilibrasse. Considerando que foi uma Lei Complementar do Congresso Nacional,
os 40% não passavam pelo orçamento do Governo, indo direto para a conta do
trabalhador, mas os 10% adicionais passavam no orçamento, com uma entrada e com
uma saída imediata. Desse modo, não surtia reflexo no orçamento, nem no
superávit fiscal. Por via de consequência, entrava uma receita extraordinária
do FGTS e saia na mesma hora o depósito na conta do FGTS, para cumprir o papel
original da Lei Complementar nº 110/2001. Ocorre
que em fevereiro de 2012 o Governo entendeu de não repassar para o FGTS 2,96
bilhões de reais, ou seja, o dinheiro foi recolhido pelos empresários com base
em um acordo feito em 2001, e o Governo deveria, por não ser orçamentário,
repassar como sempre fez ao longo de todos os anos. O Governo ficou com a
receita sem que tivesse a respectiva despesa, sendo que esses recursos estavam
ajudando uma composição orçamentária
. Frisou que o dinheiro do FGTS não
pode servir para isso, por ser um recurso do trabalhador. O Conselheiro
ressaltou que é preciso considerar que existe no Congresso Nacional um Projeto
de Lei do Senador Renato Casagrande, relatando que essa conta já fechou, ou
seja, o recurso que o FGTS precisava para repor aos trabalhadores o complemento
do Plano Verão e Plano Collor I foi suficiente. Enfatizou que, sendo esses
recursos suficientes para a reposição, estava na hora de acabar, em benefício
de outro processo, também na agenda do Governo e dos empresários, para diminuir
o impacto ou os custos da folha de pagamento. Reafirmou que, estando os custos
referentes à decisão do STF cobertos, fazia-se
 necessário
desonerar a folha de pagamento sem nenhum prejuízo para o trabalhador e,
entretanto, os quase 3 bilhões de reais estavam compondo orçamento do Governo,
sem prazo de retorno, sendo que esse dinheiro do FGTS deveria estar financiando
saneamento, infraestrutura, casa popular, etc. (…)”
[2]

 

Como visto, atingindo-se assim o
superávit e com o escopo de evitar que o tributo permanecesse por tempo
indeterminado e com parecer favorável da Caixa Econômica Federal – CEF, esta
fixando o prazo de julho de 2012 como mais acertado para extinção da
contribuição adicional, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados aprovaram por
ampla margem de votos (315 votos favoráveis, 95 contrários e uma abstenção) o PLP
n.º 200/2012, fixando o prazo final de vigência da contribuição adicional para
01/06/2013.

Destaque merecido ao projeto
original, que previa a extinção da contribuição já em 31/12/2010,
justificando-se pelo fato de que o fundo já estaria com as contas solventes e
que a imposição do limite temporal para a cobrança da contribuição era
necessária tanto porque esgotada a sua finalidade quanto pelo fato de que o
adicional onera ainda mais a carga tributária das empresas e o seu impacto
reflete negativamente sobre a competitividade do setor produtivo, bem como
inibe a formalização do emprego no país.

Todavia, a Presidente da República vetou
integralmente o projeto, através do despacho n.º 301, de 23 de julho de 2013, in
verbis
:

“Senhor Presidente do Senado Federal,

Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1.º do art. 66 da
Constituição, decidi vetar integralmente, por contrariedade ao interesse
público, o Projeto de Lei Complementar n.º 200, de 2012 (n.º 198/07 no Senado
Federal), que ‘Acrescenta § 2.º ao art. 1.º da Lei Complementar no 110, de
29 de junho de 2001, para estabelecer prazo para a extinção de contribuição
social’
.

Ouvidos, os Ministérios do Trabalho e Emprego, do Planejamento,
Orçamento e Gestão e da Fazenda manifestaram-se pelo veto ao projeto de lei
complementar conforme as seguintes razões:

‘A extinção da cobrança da contribuição social geraria um impacto
superior a R$ 3.000.000.000,00 (três bilhões de reais) por ano nas contas do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, contudo a proposta não está
acompanhada das estimativas de impacto orçamentário-financeiro e da indicação
das devidas medidas compensatórias, em contrariedade à Lei de Responsabilidade
Fiscal. A sanção do texto levaria à redução
de investimentos em importantes programas sociais e em ações estratégicas de
infraestrutura, notadamente naquelas realizadas por meio do Fundo de
Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FI-FGTS
.
Particularmente, a medida impactaria
fortemente o desenvolvimento do Programa Minha Casa, Minha Vida, cujos
beneficiários são majoritariamente os próprios correntistas do FGTS
.’

Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar o projeto em
causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do
Congresso Nacional.” (Grifamos)

 

Analisando o r. despacho da
Presidente suso transcrito, observamos
que o veto foi exclusivamente político, não trazendo em seu corpo qualquer
fundamentação jurídica para a manutenção da contribuição em comento.

Todavia, a permanência da
contribuição em nosso sistema não se justifica, afinal, a visada recomposição
do fundo já foi realizada e desde 2008 e o patrimônio líquido do FGTS voltou a
ser positivo. De acordo com destaques da já comentada Ata da 127.ª Reunião
Ordinária do Conselho Curador do FGTS, realizada em 6 de março de 2012, existem
mais de 110 bilhões de reais em
disponibilidade no Fundo.

Inobstante, o Poder Judiciário,
especificamente o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, tem entendido que “não
se poderia presumir” o atendimento da finalidade da contribuição ou,
simplesmente, que esta contribuição não teria sido estipulada expressamente com
finalidade específica. Assim, a jurisprudência tem defendido que para
verificação da satisfação da finalidade, é necessária análise técnica ampla,
através de perícia e discriminação específica das contas do fundo, o que
incumbiria, ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo, pois a contribuição,
conforme o art. 1.º da Lei Complementar 110/01, não tem prazo previsto para seu
exaurimento, de forma que incide o art. 97, inciso I, do CTN, isto é, somente a
Lei poderia estabelecer a extinção de tributos
.

A questão está agora sob julgamento no
âmbito do Supremo Tribunal Federal, objeto do Recurso Extraordinário n.º 
878.313/SC (Constitucionalidade da manutenção de contribuição social após atingida a
finalidade que motivou a sua instituição: T
ema n.º 846) e é matéria com repercussão geral reconhecida.

Nesse ponto, merece aqui a transcrição de
trecho do voto do Ministro Joaquim Barbosa, quando da análise do AG. REG. NO
AGRAVO DE INSTRUMENTO n.º 763.010 DISTRITO FEDERAL, literis:

“(…) Assim, a existência das contribuições com todas
as suas vantagens e condicionantes deveria preservar sua destinação e
finalidade
. Frisou-se que a constitucionalidade das contribuições seria
aferida pela necessidade pública
atual do dispêndio vinculado e pela eficácia dos meios escolhidos para alcançar
essa finalidade
. Sublinhou-se que a jurisprudência do Supremo teria
considerado constitucionais as referidas contribuições, que objetivariam
custear os dispêndios da União, em decorrência de decisão do STF que entendera
devido o reajuste do saldo do fgts, desde que respeitado o prazo de
anterioridade para início das respectivas exigibilidades. ADI 2556/DF, rel.
Min. Joaquim Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2556) e ADI 2568/DF, rel. Min. Joaquim
Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2568) Consignou-se que as restrições previstas nos
artigos 157, II, e 167, IV, da CF, seriam aplicáveis aos impostos e, no caso em
exame, tratar-se-ia da espécie
tributária contribuição, nitidamente caracterizada pela prévia escolha da
destinação específica do produto arrecadado
. Afastou-se a suposta ofensa ao art. 194 e seguintes da CF, uma vez
que o produto arrecadado não seria vinculado a qualquer dos programas, ou
iniciativa de seguridade social
. Não se vislumbrou vulneração ao art. 10,
I, do ADCT, em face de a exação, em análise, não se confundir com a
contribuição devida ao fgts, tendo em conta a diferente finalidade do produto
arrecadado. O tributo não se destinaria à formação do próprio fundo, mas
visaria custear uma obrigação da União. Repeliu-se, ainda, a assertiva de
violação da capacidade contributiva (CF, art. 145, § 1º). O perfil da exação
não se remeteria às características de ordem pessoal do contribuinte ou dos
demais critérios da regra matriz, mas tomaria por hipótese de incidência a
circunstância objetiva da demissão sem justa causa do trabalhador. Essa materialidade
não constituiria ato ilícito por se inserir na esfera de livre gestão do
empregador, ainda que desencorajada pelo sistema jurídico e, portanto, poderia
ser tomada por hipótese de incidência tributária. Por fim, julgaram-se
parcialmente procedentes os pleitos para declarar a inconstitucionalidade do
art. 14, caput, I e II, da norma questionada, no que se refere à expressão
produzindo efeitos. Vencido o Min. Marco Aurélio, que assentava a procedência
do pedido. Reputava que teriam sido criadas contribuições com o objetivo não
contemplado na Constituição, qual seja, reforçar o caixa e a responsabilidade
do Tesouro Nacional. Asseverava que os valores arrecadados não colimariam
beneficiar os empregados, porém cumprir o que o STF reconhecera como direito
dos trabalhadores em geral: a reposição do poder aquisitivo dos saldos das
contas do fgts, a prescindir de normatividade. ADI 2556/DF, rel. Min. Joaquim
Barbosa, 13.6.2012. (ADI-2556) e ADI 2568/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa,
13.6.2012. (ADI-2568).
Eventual
perda superveniente de validade do tributo, em razão do cumprimento de seus
objetivos, deverá ser examinada a tempo e modo próprios, pelos órgãos
administrativos ou judiciais dotados de competência originária para tanto
. (…)” (Grifamos)

 

Resta evidenciado que a Suprema Corte, cautelosa
que é, já deixou explicitado que, ao se exaurir a finalidade da mencionada
contribuição, caberia um novo exame da matéria e é exatamente isto o que o e.
STF está fazendo em sede de repercussão geral reconhecida.


Julgamentos aguardados no e. STF

Conforme
informamos, além de aguardarmos o julgamento do Recurso Extraordinário n.º
878.313/SC, com repercussão geral reconhecida e de Tema 846: Constitucionalidade
da manutenção de contribuição social após atingida a finalidade que motivou a
sua instituição
, temos que o TRF 4.ª Região estava para apreciar a
matéria na Arguição de Inconstitucionalidade n.º 5029170-55.2015.4.04.0000, porém, o
Desembargador Federal Celso Kipper suscitou uma questão de ordem para suspender
o feito até que o e. STF se pronuncie sobre a matéria nos autos da ADIN n.º
5.050
, o que foi acolhido pela Corte Especial em 23/06/2016, assim, o processo
ficará suspenso no TRF 4.ª Região aguardando a decisão do Supremo Tribunal
Federal.

A ADIN – Ação Direta de
Inconstitucionalidade n.º 5.050 foi
ajuizada
em 08/10/2013 pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro – CNSF, na qual
se postula, inclusive, a concessão de medida liminar para suspender a eficácia
do art. 1.º da Lei Complementar n.° 110, de 29 de junho de 2001, foi proferido
despacho pelo Ministro Luís Roberto Barroso solicitando, já em 11/10/2013 informações
às Presidências da República e do Congresso Nacional, ao Advogado-Geral da
União para manifestação e ao Procurador-Geral da República para parecer.

O
processo já está com manifestação da Procuradoria Geral da República
desfavorável ao reconhecimento do esgotamento de finalidade e aguardando o
julgamento. 

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[1] Advogado – OAB/RS e Contabilista –
CRC/RS, Especialista em Direito Tributário, Financeiro e Econômico pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, atuante na área tributária,
sócio da HOMRICH PORTINHO & ASSOCIADOS – ADVOCACIA PÚBLICA E EMPRESARIAL
S.S. (HP&A).

[2] Ata da 127.ª Reunião
Ordinária do Conselho Curador do FGTS, realizada em 6 de março de 2012 Páginas
19/23.