Astreintes são devidas apenas ao credor da obrigação e não podem ser divididas com o Estado

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Não há lacuna legal suficiente para
destinar, mesmo parcialmente, as astreintes para o Estado e não ao
credor da obrigação. Por maioria, a Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) rejeitou a proposta do relator, ministro Luis Felipe
Salomão, de dividir a condenação. Prevaleceu o voto do ministro Marco
Buzzi, que mantém a jurisprudência do tribunal.

“Embora o texto
de lei não seja expresso sobre o tema”, afirmou o ministro Buzzi,
“inexiste lacuna legal no ponto, pertencendo exclusivamente ao autor da
ação o crédito decorrente da aplicação do instituto”.

“Quando o
ordenamento processual quer destinar ao Estado o produto de uma sanção,
assim o faz expressamente, estabelecendo parâmetros para sua aplicação,
como bem se depreende do disposto no artigo 14 do Código de Processo
Civil (CPC)”, acrescentou.

Para o ministro Buzzi, é impossível
estabelecer a titularidade estatal para o recebimento das astreintes por
violar o princípio constitucional da legalidade em sentido estrito e da
reserva legal. Conforme o ministro, a norma que prevê penalidades deve
sempre prever um patamar máximo, delimitador da discricionariedade da
autoridade sancionadora.

Direito material

No
voto prevalecente, o relator do acórdão apontou que a multa diária por
descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, as astreintes,
possuem função de direito material.

Segundo Buzzi, o instituto
objetiva ressarcir o credor pelo tempo que se encontra privado do bem da
vida tutelado, coagir indiretamente o devedor e servir como incremento à
ordem judicial final ou cautelar. Para o ministro, reconhecida uma
função de direito material na multa, a titularidade do credor restaria
induvidosa.

Ele também ressaltou que a multa é apenas uma das
providências disponíveis ao magistrado, havendo outros meios mais
eficazes para alcançar a pronta satisfação do direito do credor.

Inutilidade

No
caso concreto, tratou-se de ação revisional. A multa fora aplicada por
conta do descumprimento da obrigação de se excluir o nome da autora de
cadastros de proteção ao crédito. A solução final da ação alterou
minimamente o contrato, restando certa a inadimplência da autora.

O
ministro entendeu que na hipótese, as astreintes eram inúteis, já que o
próprio magistrado poderia ter expedido ofício diretamente ao órgão de
cadastro, para afastar o estado de mora da autora e obter a satisfação
imediata da ordem judicial.

Enriquecimento ilícito

Em
vista dessas circunstâncias, o relator entendeu que a redução
substancial do valor da multa estipulado pelo tribunal de origem seria
adequada. A condenação somou R$ 393.600,00 ao longo de sete anos. Porém,
os parâmetros do STJ arbitram cifras entre R$ 5 mil e R$ 15 mil para
indenizações por registro indevido em cadastros de proteção ao crédito.

Como
a autora se encontrava efetivamente inadimplente ao final da ação de
conhecimento, a Turma entendeu adequado restabelecer o valor da multa ao
valor fixado na sentença, evitando-se seu enriquecimento sem causa: R$
7.932,00, corrigidos pela taxa Selic a partir de 2004.

Divergência

O
relator original, ministro Luis Felipe Salomão, propunha a fixação da
multa em R$ 100 mil, a ser dividida igualmente entre o Rio Grande do Sul
e a autora. Para Salomão, as astreintes não poderiam servir de
enriquecimento ilícito para o credor, mas tampouco perder seu caráter de
coercitividade frente à parte relutante em cumprir a decisão judicial.

Como
em seu entender o texto legal também seria omisso em atribuir a
destinação dos valores da multa, o ministro Salomão recorria ao direito
comparado para aplicar a norma do sistema português, que prevê a divisão
do produto financeiro decorrente de astreintes entre o Estado e o
demandante.

Para ele, a divisão resguardaria melhor tanto o
direito da parte em ter satisfeita sua pretensão quanto o interesse
estatal em ver cumprido o comando judicial.